Não me digam Não me falem Não falem sobre mim Não lembre Nem recordem de mim Deixem tudo isso De tudo isso Ao fim.
Hoje Hoje Hoje Não quero nada Voglio niente Nem escrever não quero Não quero nada
Não quero ouvir sobre a vida e o fim… Hoje não quero acreditar em nada que dizem.
Escrevi para você enquanto tomava banho. Foi desligar o chuveiro, abrir a porta e a nossa carta se perdeu. Adeus Era o que eu não queria dizer. Não agora, Não ainda Não tão depressa.
Enquanto tomava banho tentei entender o que me pediram Para - pedir rezar pensar - que você pudesse ir em paz. Eu tentei entender e não consegui. Ir para onde? Quando? Como?
Como foi que tudo isso aconteceu?
Na água do banho eu tentei chorar. Eu não consegui. Eu rastelei na cabeça a ideia de que haveria tempo de atualizar as fotos para que houvessem recentes. Para fazer a chamada de vídeo que ficou por combinar Para planejar a viagem do fim do ano, Para falar dos livros, dos quadrinhos, das pinturas Do Rio de Janeiro, Do funk, Da ópera vista em Nova York.
Não dava tempo. Eu fui para o jardim ouvir que a vida é assim
Então Eu tentei pôr de volta na estante o que era pensado no ano antes, quando tudo estava controlado, cuidado, encaminhado… Eu não consegui.
Eu deixei tudo como estava, A espera pela próxima mensagem Pela próxima conversa. Eu continuei calculando as datas de chegada, O roteiro dos dias, As histórias que veríamos no cinema, no teatro, nas páginas e no teu videogame.
Em mim ainda a esperança Vai ficar tudo bem…
Alguém falava sobre fim. E eu não alcanço nem o desfecho do texto… Desisto. Me diziam para que na minha - falta - crença eu pedisse que fosse em paz… Posterguei as reticências… Estiquei contratempo. Não acreditei. Não acredito.
Quando foi que isso aconteceu?
O que aconteceu com o diagnóstico precoce? Com tratamento rápido? Com tudo controlado? Com o recuo? Com… Com… ...
Eu que esperei... Eu esperei a doença voltar para dizer que te amo. Eu não sei se você leu quando escrevi. Somos tão jovens E tão sem tempo… Para chamar… Para curar... E agora eu não tenho tempo de pegar o telefone Para saber de você, Não tenho tempo de pegar um ônibus, um avião, um trem… Eu não tenho tempo de ser melhor para você E dizer tudo o que você foi, o que você é para mim… Tudo o que você ainda e sempre vai ser para mim. Eu vou morrer junto com você.
O que eu faço com essa esperança? Com o último suspiro dos meus pedidos e rezas por mais uma chance? O que eu faço quando eu acredito que ainda é cedo que ainda dá tempo que na próxima manhã vai ser diferente? O que eu faço quando alguém escrever dizendo… E eu ainda esperar, ainda rezar, ainda pedir pelo milagre.
O que eu faço quando acredito em milagre? Quando eu peço a vida, ao Deus do mundo, a natureza, ao destino, por milagre?
Na palavra fim eu chorei Com soluço com um peso caindo na minha cabeça na minha garganta No meu estômago
E eu só queria dizer Não vá Não vá agora Não ainda Espera a nossa viagem a nossa conversa Nosso plano, Mais um vinho…
Espera que é ainda cedo Que ainda quero mostrar a tese que não escrevo, As páginas que não publico Os lugares estranhos.
Espera Porque eu não sei se você sabe Quando foi que ficamos amigas Amigas de verdade Para sempre
Não sei se você sabe que eu me importo mesmo. Que eu te amo…
Espera Só mais um minuto. Eu espero por um milagre.